Dalmazzo, Castro e Tarpinian

A ilegal equiparação do atacadista de cosméticos a estabelecimento industrial. Indevida incidência de IPI em tais operações.

Em Setembro de 2006 foi publicado, na Revista Dialética de Direito Tributário n. 132, artigo de nossa autoria intitulado “Ilegalidade e inconstitucionalidade do art. 13 da Lei n. 11.281/06 (a figura do encomendante de importação equiparado a estabelecimento industrial)”.

Em tal artigo demonstrávamos que não poderia o legislador, a seu bel prazer, equiparar a estabelecimento industrial sujeitos estranhos à industrialização, tão somente para que o IPI alcançasse tais operações.

No caso, já havia incidência de IPI na entrada do bem importado, e a discussão dava-se em razão de nova incidência na saída do estabelecimento importador (via encomenda), que não realizava nenhuma atividade típica de industrialização.

Felizmente o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no 1º semestre de 2014, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial – EREsp n. 1.398.721/SC, encerrou essa discussão, reconhecendo a ilegalidade da cobrança de IPI na mera revenda de produtos importados (hipótese que alcança não só as operações de importação direta, como também as operações por encomenda e por conta e ordem de terceiro, já que os argumentos do julgado também alcançam a equiparação feita quer ao encomendante quer ao adquirente, respectivamente).

No início deste ano de 2015, nosso Governo trouxe algumas inovações tributárias, visando aumentar a arrecadação para fazer frente à crise econômica que o Brasil enfrenta e, pasmem, o mecanismo da “equiparação a estabelecimento industrial” foi novamente adotado.

A novidade arrecadatória inerente ao mecanismo supracitado encontra-se explicitada no Decreto n. 8.393, de 28 de janeiro de 2015.

Grosso modo, esse Decreto faz com que as vendas de cosméticos por estabelecimento atacadista, a partir do dia 1º de maio de 2015, seja onerada pelo IPI, já que o equipara a estabelecimento industrial.

Insista-se, passará a ser tributado como se industrial fosse o mero atacadista dos produtos abaixo, ainda que não realize atividades típicas de industrialização:

Código TIPI DESCRIÇÃO ALÍQUOTA
3303.00.10 Perfumes (extratos) 42%
3304.10.00 Produtos de maquiagem para os lábios 22%
3304.20 Produtos de maquiagem para os olhos 22%
3304.30.00 Preparações para manicuros e pedicuros 22%
3304.9 Outros 22%
3305.20.00 Preparações para ondulação ou alisamento, permanentes, dos cabelos 22%
3305.90.00 Outras 22%
3307.10.00 Preparações para barbear (antes, durante ou após) 22%
3307.30.00 Sais perfumados e outras preparações para banhos 22%
3307.4 Preparações para perfumar ou para desodorizar ambientes, incluindo as preparações odoríferas para cerimônias religiosas 22%
3307.90.00 22%

 

Todavia, resta evidente que os argumentos justificadores para rechaçar a equiparação do importador a estabelecimento industrial se enquadram aqui (quando o equiparado a estabelecimento industrial é o atacadista de cosméticos).

Nosso ordenamento jurídico não permite que ficções como essa possam trazer tributação além dos limites estabelecidos pela Constituição Federal.

Se o legislador puder classificar como estabelecimento industrial quem ele bem entender, resta evidente que não teremos mais limites à tributação pelo IPI e, assim, a repartição da competência explicitada em nossa Constituição restará frontalmente violada.

É exatamente esse o pensamento do Prof. Paulo de Barros Carvalho:

“…a obrigação tributária só se instaura com sujeito passivo que integre a ocorrência típica, seja direta ou indiretamente unido ao núcleo objetivo da situação tributada. A ênfase afirmativa está fundada num argumento singelo, mas poderoso: o legislador tributário não pode refugir dos limites constitucionais da sua competência…”

(CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16ª Ed., São Paulo : Saraiva, 2004, p. 320)

Como já temos precedentes em casos similares (inclusive do STJ, em julgamento de sua 1ª Seção, o que demonstra a solidificação do posicionamento naquela Corte Superior), as empresas atacadistas que comercializam os produtos acima listados devem buscar medidas preventivas para não serem atingidas por essa ilegal e inconstitucional tributação.

Danilo Monteiro de Castro – advogado, mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), MBA em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito de Itu. Professor de Seminário no Curso de Especialização em Direito Tributário do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Membro associado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Sócio do escritório Dalmazzo & Castro Advogados Associados.