Dalmazzo, Castro e Tarpinian

Elementos caracterizadores do vínculo empregatício

O presente artigo tem como escopo trazer algumas peculiaridades atinentes às formas de contrato de trabalho não regidos pela CLT (prestação de serviço, trabalho autônomo, etc.) e a possibilidade de referida relação contratual estar revestida dos elementos caracterizadores do vínculo empregatício, o que culminaria na possibilidade do trabalhador pleitear judicialmente a nulidade do contrato cível, com o reconhecimento do vínculo empregatício e, caso obtenha o êxito pretendido, fazer jus ao recebimento de todas as verbas incidentes ao contrato de trabalho, nos moldes da CLT.

É comum no meio empresarial a contratação de pessoas físicas ou jurídicas para prestação de serviços em favor da empresa, mediante a elaboração de um contrato civil firmado entre as partes, cuja relação, ao menos formalmente, não traria nenhuma característica de natureza empregatícia, o que, portanto, isentariam as partes da observância de algumas obrigações inerentes ao contrato celetista, como, p.ex., por parte do empregador, o pagamento de 13º salário, férias acrescidas do terço constitucional, efetuar o depósito do FGTS, etc., e, ao empregado, subordinar-se às normas e ordens efetivas aos exercícios de suas atividades, comparecer habitualmente ao local de trabalho, não ter a possibilidade de fazer-se substituir por outrem caso necessário, dentre outros que serão analisados adiante.

Ocorre que o contrato de natureza civil poderá acarretar riscos futuros à empresa, tendo em vista que, na prática, a relação entre contratante (empresa) e contratado (pessoa física ou jurídica) ser, na realidade, uma relação empregatícia, o que ensejaria ao contratado o direito de pleitear o reconhecimento do vínculo empregatício, incidindo sobre os valores pagos mensalmente todos os encargos previstos na CLT, desde a data da contratação até o momento da ruptura contratual.

Desta forma, para evitar que um contrato de natureza civil seja convolado em contrato empregatício, deverão as empresas estarem cientes dos elementos que são inerentes ao contrato de trabalho celetista, a fim de evitar futuras demandas trabalhistas com esta natureza.

Para tanto, reproduziremos abaixo os conceitos de empregador e empregado trazidos pela CLT, mais precisamente no caput de seus artigos 2º e 3º, respectivamente, que assim determinam:

“Art. 2º – Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. (…)”

“Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. (…)”

Da análise conjunta dos artigos acima transcritos, extraímos todos os elementos que, se ocorrerem de forma concomitante, configurarão certamente a existência de uma relação empregatícia, mesmo numa relação formalizada sob a égide de um contrato de natureza diversa. Elencamos, a seguir, os elementos que configuram o vínculo empregatício:

  • Prestação de serviço realizado por pessoa física: Será considerado empregado para fins de contrato de trabalho celetista a pessoa física, sendo a esta assegurada todos os direitos inerentes ao Direito do Trabalho, o que não socorre à pessoa jurídica.
  • Com Pessoalidade: Trata-se a pessoalidade do requisito pelo qual o empregado não poderá fazer-se substituir por outro no exercício de suas atividades, ou seja, trata-se de obrigação personalíssima do contratado com seu contratante.
  • De forma não eventual: Por tal elemento, considera-se a natureza contínua na prestação do serviço, a habitualidade no exercício das atividades, ou seja, que se repetirá no decorrer da execução do contrato de forma não fracionada, inserindo-se o contratado na rotina normal da empresa. Apenas a título exemplificativo, considerou o Tribunal Superior do Trabalho como habitual, para configuração do vínculo empregatício da diarista, o labor prestado no mínimo 03 vezes por semana, acarretando assim o dever do empregador em efetuar o registro além de conceder todos os direitos celetistas inerentes ao empregado celetista.
  • Com onerosidade: A relação de emprego é essencialmente econômica, tendo em vista que o empregador, a título de contraprestação, irá realizar o pagamento da remuneração contratada em decorrência dos serviços mensais prestados. Trata-se a onerosidade da dependência econômica que possui o empregado em relação ao empregador, sendo referida remuneração sua principal fonte de renda.
  • E mediante subordinação: Este seria o principal elemento a se aferir a fim de constatar se a relação entre as partes seria realmente de cunho civil ou de natureza empregatícia. A subordinação nada mais é que a obediência hierárquica, técnica e disciplinar que possui o empregado/contratado ao empregador/contratante, caso que não ocorre nos contratos de cunho civil, cuja subordinação não existe, seja ela técnica ou disciplinar.

Para a configuração do vínculo empregatício, portanto, serão necessárias as presenças de todos os requisitos acima elencados, de forma concomitante, sendo que, na ausência de somente 01 deles não será reconhecida a relação empregatícia.

Desta forma, deverão as empresas que possuem contratos de natureza civil se atentarem à forma na qual eles estão sendo executados, tendo em vista que, por diversas vezes, em razão da própria posição de contratante, este acaba se impondo sobre o contratado, direcionando as atividades por ele realizadas, e, se presentes os demais requisitos, se torna iminente o risco de ser futuramente demandado perante a Justiça do Trabalho.

Portanto, anteriormente à contratação de profissionais visando a prestação de serviços mediante a elaboração de um contrato de natureza civil, deverá a empresa sopesar se a natureza da relação entre as partes será realmente isenta dos elementos caracterizadores do vínculo empregatício, pois, caso futuramente seja declarada a nulidade de referido contrato, o ônus será considerável, tendo em vista as diversas verbas que incidirão sobre os valores pagos a título de contraprestação enquanto vigente o contrato firmado entre as partes.

Eduardo Alessandro Silva Martins – advogado e pós-graduando em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).