Dalmazzo, Castro e Tarpinian

Há prazo prescricional para o redirecionamento de execução fiscal a terceira empresa, supostamente sucessora da devedora principal?

O interesse pelo tema adveio de julgado proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região onde restou asseverado que “O responsável tributário por sucessão passa a responder pela dívida no estado em que se encontra; se o direito de ação já foi exercido e o prazo prescricional, interrompido, ele assume a prestação em plena exigibilidade. Não seria lógico que o período de prescrição fosse contado novamente só porque o sucessor integrou o polo passivo da execução.” (TRF3. 2ª Turma. Agravo de Instrumento n. 0035281-12.2011.4.03.0000/SP. Juiz Federal convocado Leonel Ferreira. D.E. 22/05/2015).

Pelo entendimento acima, portanto, inexiste prazo para o redirecionamento de execução, inicialmente ajuizada em face da devedora principal (sucedida), à suposta empresa sucessora. Não nos parece ser essa a melhor interpretação. Vejamos:

A responsabilidade por sucessão encontra-se explicitada nos artigos 129 a 133 do Código Tributário Nacional (CTN). Particularmente nos interessa, ante os objetivos desse estudo, a redação do artigo 133:

“Art. 133 – A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato:

I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;

II – subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão

(…).”

Exemplificando o caso temos: Empresa X é executada pela União, por débitos de 2000 e 2001, em ação ajuizada em 2004. Citada normalmente, no mesmo ano (2004), a empresa X tem seu faturamento penhorado em 2006. Todavia, quando o Oficial de Justiça vai cumprir este mandado de penhora, descobre que o fundo de comércio da Empresa X foi adquirido pela Empresa Y, que lá encontra-se estabelecida, sendo que a empresa “sucedida” não mais explora atividade (hipótese do inciso I, do art. 133 do CTN). A certidão do Oficial de Justiça atestando isso deu-se em 2007. A União, exequente neste feito, solicita que a execução passe a correr em desfavor da Empresa Y, por tratar-se de responsabilidade por sucessão, porém tal pleito é formulado em 2013.

Pergunta-se, há prescrição desta pretensão de responsabilizar a Empresa Y?

Pelo raciocínio empregado no julgado colacionado no início deste texto, a resposta é negativa, mas na nossa visão não há como eternizar esse risco (de responsabilidade tributária) se o exequente deixou de promover a inclusão desta nova pessoa (física ou jurídica) no momento processual apropriado.

Infelizmente ainda não se tem uma jurisprudência consolidada em torno do tema (prescrição “intercorrente” nos casos de responsabilidade por sucessão, em especial naquelas enquadradas no inciso I do artigo 133 do CTN). O entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em relação à responsabilização do sócio nos dá um norte de como o tema aqui deve também ser tratado. Vejamos:

A teoria hoje predominante no STJ é no sentido de que o redirecionamento deve dar-se em até 5 (cinco) anos contados da citação da pessoa jurídica (devedora principal):

É orientação pacífica do Superior Tribunal de Justiça que a citação dos corresponsáveis eventuais, para interromper a prescrição em relação ao pedido de redirecionamento da execução fiscal, deve ocorrer em até cinco anos a partir da citação da pessoa jurídica. Precedentes do STJ.”

(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial n. 500.020/RS. Ministro Relator Napoleão Nunes Maia Filho. Dje 01/07/2015).

No exemplo anteriormente apresentado, a responsabilização da sucessora, utilizando essa contagem do prazo prescricional, deveria ocorrer até 2009 (5 anos depois da citação da devedora principal), sob pena de perecimento desta pretensão.

É certo que o momento de início do prazo prescricional no redirecionamento será reanalisado pelo STJ (no Recurso Especial n. 1.201.993/SP), mas ainda que o mesmo seja alterado (passando a contar da actio nata – isto é, da data em que o exequente teve ciência de situação – prova – capaz de justificar o redirecionamento), é certo que ultrapassado tal lapso de tempo, perder-se-á o direito à responsabilização do terceiro.

No exemplo apresentado acima, mesmo com o início do prazo pela actio nata, isto é, ciência da situação motivadora da responsabilização (no caso, Certidão do Oficial de Justiça de 2007), o redirecionamento deveria ocorrer até 2012, o que não aconteceu por exclusiva inércia da fazenda.

Ora, se o instituto da prescrição existe para evitar a eternização de conflitos, em prol da segurança jurídica, descabida, em nosso sentir, a alegação de que o mesmo não atinge a responsabilização por sucessão, isto é, que o Fisco pode requerê-la em qualquer momento e em qualquer situação.

As razões apresentadas pelo STJ para justificar a incidência da prescrição quando do redirecionamento do feito ao sócio gerente se aplicam, também, à responsabilidade por sucessão (ainda que, aqui, se faça necessário rever o dies a quo  – de despacho citatório da devedora principal para actio nata):

“a citação da sociedade executada interrompe a prescrição em relação aos seus sócios-gerentes para fins de redirecionamento da execução fiscal, que deverá ser promovida no prazo de cinco anos, prazo esse estipulado como MEDIDA DE PACIFICAÇÃO SOCIAL E SEGURANÇA JURÍDICA, COM A FINALIDADE DE EVITAR A IMPRESCRITIBILIDADE DAS DÍVIDAS FISCAIS.”

(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. Agravo Regimental no Agravo n. 1.297.255/SP. Ministro Relator Napoleão Nunes Maia Filho. Dje 27/03/2015).

Pelo exposto, e independente da definição do início de sua contagem, a prescrição deve sim ser observada quando do redirecionamento de determinada execução fiscal a terceira empresa, sob alegação de que esta sucedeu a devedora principal, caso contrário estaremos na contramão da pretendida pacificação social e segurança jurídica, com a eternização de conflitos e imprescritibilidade das dívidas fiscais.

Danilo Monteiro de Castro – advogado, mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), MBA em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito de Itu. Professor de Seminário no Curso de Especialização em Direito Tributário do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Membro associado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Sócio do escritório Dalmazzo & Castro Advogados Associados.