Dalmazzo, Castro e Tarpinian

O crédito presumido de ICMS deve integrar a base de cálculo das contribuições PIS e COFINS?

O crédito presumido de ICMS, incentivo fiscal concedido pelos Estados visando atrair as empresas e estimulá-las a investirem em seus territórios, é um crédito fictício (ou seja, não decorre, efetivamente, da entrada de mercadorias tributadas pelo ICMS) que incide sobre os valores apurados com base em operações realizadas anteriormente pelo contribuinte.

A inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS é matéria que tem sido julgada como inconstitucional pelos Tribunais Regionais Federais, uma vez que não se trata – o crédito presumido de ICMS – de faturamento ou receita tributável, ou seja, não se configura como riqueza reveladora de capacidade contributiva, mas tão somente como mera recuperação de custos na forma de incentivo fiscal e que, portanto, não deve integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS.

Isso porque o PIS e a COFINS são tributos (gênero da espécie contribuições sociais) que devem incidir, exclusivamente, sobre a receita ou o faturamento, consoante disposição do art. 195, I, “b”, da CF/88. Logo, se o referido crédito presumido de ICMS não ostenta a natureza de receita ou faturamento, não poderá ele integrar a base de cálculo das contribuições do PIS e da COFINS.

O conceito de faturamento ou receita bruta, que advém do direito comercial, representa a soma dos valores das operações provenientes da venda de mercadorias e prestação de serviços. No julgamento do RE 585.235/MG (submetido a repercussão geral), o Supremo Tribunal Federal definiu que a noção de faturamento deve ser entendida no sentido estrito de receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços de qualquer natureza, ou seja, a soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais, consoante interpretação dada pelo RE n. 371.258 AgR (Segunda Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 03.10.2006), pelo RE n. 400.479-8/RJ (Segunda Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 10.10.2006) e pelo RE n. 527.602/SP (Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, Rel. p/acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 05.08.2009), sendo que nesse último ficou estabelecido que somente são excluídos do conceito de faturamento os aportes financeiros estranhos à atividade desenvolvida pela empresa”.

Nesta senda, considerando que as contribuições de PIS e COFINS apenas podem incidir sobre o faturamento ou receita do contribuinte (art. 195, I, “b”, da CF/88), sendo estes entendidos como a receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços de qualquer natureza, isto é, a soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais; e, ainda, que deve ser excluído do conceito de faturamento “os aportes financeiros estranhos à atividade desenvolvida pela empresa” (como é o caso do crédito presumido de ICMS), temos que a inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS é totalmente inconstitucional, pois amplia a base de cálculo prevista no Texto Constitucional, ferindo o princípio constitucional da capacidade contributiva, da isonomia e da proporcionalidade.

Este não é o posicionamento, porém, adotado pela Receita Federal, conforme parecer exarado na Solução de Consulta n.  69 de setembro de 2011, onde entende que o crédito presumido de ICMS deve integrar a base de cálculo das mencionadas contribuições (PIS e COFINS) em função da inexistência de previsão legal permitindo a sua exclusão, ou seja, que tal possibilidade caracterizar-se-ia como isenção e dependeria, assim, de lei, para que pudesse ser concedida.

Entretanto, felizmente, o Judiciário tem adotado posicionamento diametralmente oposto ao externado pela Receita Federal, se pronunciando, até o momento, pelo afastamento da inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.

Neste sentido se consolidou a jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais, que tem sido amplamente favorável aos contribuintes, conforme se verifica das decisões proferidas pelo TRF da 1ª Região, (AMS 2005.32.00.001528-0, Desembargador Federal marcos Augusto de Souza, 8ª Turma, Data: 04/09/2015); TRF da 2ª Região (AC 201150010080629, Desembargador Federal Ricardo Perlingeiro, 3ª Turma, data:10/01/2014.); TRF da 3ª Região (ApelReex 00081723120084036110, Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, 6ª Turma, data: 02/10/2015); TRF da 4ª Região (AC 00323141220084047100, Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona, 2ª Turma, data: 12/05/2010); e TRF da 5ª Região (ApelReex 200983080006295, Desembargador Federal Lazaro Guimarães, 4ª Turma, data: 22/04/2016).

O Superior Tribunal de Justiça também já se pronunciou acerca do tema, tendo se posicionado, assim como os Tribunais Regionais Federais, pela não inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, conforme trecho a seguir destacado do voto do Ministro Relator Napoleão Nunes Maia Filho, da 1ª Turma do STJ:

“(…) 3. Assim, o crédito presumido do ICMS configura incentivo voltado à redução de custos, com vistas a proporcionar maior competitividade no mercado para as empresas de um determinado Estado-membro, não assumindo natureza de receita ou faturamento, razão pela qual não pode ser incluído na base de cálculo do PIS e da COFINS.

(…) 5. Agravo Regimental da Fazenda Nacional desprovido.”

(AgRg no REsp 1363902/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/08/2014, DJe 19/08/2014)

Em que pese a quantidade extrema de precedentes favoráveis aos contribuintes, é fato que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral deste tema e, portanto, irá dar a última palavra sobre esse conflito, nos autos do Recurso Extraordinário n. 835.818/PR, de Relatoria do Ministro Marco Aurélio.

Nos resta, então, torcer para que a Suprema Corte mantenha o entendimento já sedimentado nos Tribunais Regionais Federais, bem como no Superior Tribunal de Justiça, pela não incidência de PIS e COFINS sobre o crédito presumido de ICMS.

Cledir Menon Junior – advogado e pós-graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).