Dalmazzo, Castro e Tarpinian

O desbloqueio imediato do valor constrito em excesso, via BACENJUD, conforme previsto no art. 854, § 1º, do CPC/2015

O bloqueio de dinheiro localizado em depósito ou aplicação financeira, que foi inserida no art. 655-A, caput e parágrafos 1º e 2º, do CPC de 1973, por meio da Lei 11.382/2006, está agora previsto no art. 854 do CPC de 2015, e trouxe substanciais alterações em relação ao dispositivo anterior.

Neste estudo, nos ateremos, em especial e de forma sucinta, à uma destas alterações: o cancelamento de ofício pelo Juiz, no prazo de 24 horas, do numerário bloqueado que supere o valor do débito cobrado judicialmente.

O ato que dá início à penhora on line deve partir do próprio credor que, por meio de pedido formulado ao Juiz, poderá requerer que seja realizada, via Bacen-Jud, pesquisa para tentativa de localização de valores aplicados ou depositados em Instituição Financeira, para posterior constrição judicial. Ato contínuo, o Magistrado acionará o sistema Bacen-Jud, determinando que sejam bloqueados os valores correspondentes ao débito, nas contas eventualmente localizadas do devedor.

Cumpre destacar que a indisponibilidade se refere apenas ao numerário encontrado, ou seja, não é propriamente a conta bancária que será bloqueada, mas sim os valores nela depositados.

Uma vez localizado numerário do devedor em Instituição Financeira, ainda não haverá penhora, entretanto, referidos valores serão tornados indisponíveis pelo Juiz, o que impedirá que o seu titular venha a movimentá-los. A penhora apenas se efetivará após ser dado a ele (devedor) a oportunidade de impugnar o bloqueio, conforme prescreve o §3º do art. 854 do CPC/2015, competindo-lhe comprovar que o dinheiro bloqueado é impenhorável (verbas de natureza salarial, p. ex., salário, aposentadoria, pensão).

Entretanto, uma vez que o simples bloqueio já é suficiente para causar inúmeros prejuízos ao devedor, e que a pesquisa para localização de ativos financeiros abrange todas e quaisquer contas existentes em Instituições Financeiras no país, o que se denota é que tal prática vem gerando inúmeros e injustos danos ao suposto devedor,  eis que fatalmente são bloqueados valores superiores ao do débito cobrado – caso o devedor os tenha –, ante a inexistência de  meios  eficazes de controle do ato de bloqueio, via Bacen-Jud, que permita o seu cumprimento nos exatos limites do débito.

Explicando melhor: se o valor que consta na ordem de bloqueio perfaz a soma de R$10.000,00, este valor será bloqueado em todas as contas localizadas. Supondo que o devedor tenha três contas e em cada uma delas contenha o valor de R$10.000,00, ao final, serão bloqueados o total de R$ 30.000,00, pois o sistema não tem a capacidade de identificar que a ordem já foi cumprida quando do atingimento do valor do débito, liberando automaticamente as demais importâncias encontradas em outras contas.

Neste sentido leciona o Prof. Paulo Cesar Conrado:

“É certo, com efeito, que, tal como “calibrado”, o sistema BacenJud não está apto a, efetivado o rastreamento e localizadas duas ou mais contas, cessar o “bloqueio” (melhor dizer, porque mais técnico, a “indisponibilidade”) assim que atinge o limite da dívida. Por isso, os casos em que excesso se apresenta são potenciais.”

(CONRADO, Paulo César. Execução Fiscal, 2ª Ed., São Paulo : Noeses, 2015, p. 214).

Visando impedir exatamente a ocorrência desta situação absurda em que o devedor não tem acesso ao próprio dinheiro – uma vez que o bloqueio de valor superior ao supostamente devido (entenda-se por valor devido o valor considerado na ordem de bloqueio) causa inúmeros transtornos às empresas, acarretando o descumprindo involuntário de suas obrigações (pagamento de fornecedores, empregados e despesas etc.) -, prevê o §1º, do art. 854, do CPC/2015, que deverá o Juiz, de ofício, isto é, independente de pedido do devedor, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, determinar o cancelamento dos valores excessivos bloqueados.

É necessário ressaltar, como acima destacado, que o valor devido é aquele que conste na ordem de bloqueio, não podendo o Magistrado se negar, após ter determinado a ordem de indisponibilidade, a cancelar o numerário bloqueado em valor superior ao do débito sob o argumento de que é necessário atualizar o valor da dívida, ou, ainda, condicionar a liberação dos valores excessivos à manifestação de concordância ou não da parte contrária, para somente então, determinar o desbloqueio dos mesmos.

Isto é, o dever a ele atribuído no sentido de determinar o cancelamento de eventual indisponibilidade excessiva independe de qualquer pedido do devedor ou de manifestação de concordância do credor, pois prescreve o §1º do art. 854, do CPC/2015, que ao ter o Magistrado conhecimento de que foram bloqueados valores superiores ao do débito (insista-se, superior à ordem de bloqueio determinada), deverá ele (Juiz) agir no prazo de 24 (vinte e quatro) horas determinando o imediato desbloqueio deste numerário constrito em excesso, tornando-o novamente disponível ao seu titular.

Vejamos a redação do novo dispositivo que regula a penhora eletrônica de dinheiro, com redação prevista no §1º do art. 854, do CPC/2015:

“Art. 854.  Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução.

  • 1o No prazo de 24 (vinte e quatro) horas a contar da resposta, de ofício, o juiz determinará o cancelamento de eventual indisponibilidade excessiva, o que deverá ser cumprido pela instituição financeira em igual prazo.

(…).”

O que se espera, portanto, com a entrada em vigor do CPC/2015, é o estrito cumprimento deste novel dispositivo pelos Magistrados, no impreterível prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contados da resposta à determinação de bloqueio, visando exatamente impedir que as empresas que estejam sendo cobradas judicialmente continuem a ser prejudicadas pelo bloqueio excessivo de dinheiro depositado ou aplicado em Instituições Financeiras, sobretudo aquele que é superior ao valor do suposto débito exigido pelo Fisco, o que certamente, se cumprido, poderá proporcionar um processo mais justo e menos gravoso ao devedor, e diminuirá os transtornos que tal bloqueio via Bacen-Jud tem indevidamente acarretado às empresas.

Cledir Menon Junior – advogado e pós-graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).